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segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Poetas, plágio e redes sociais

Imagem: reprodução da Internet
Compartilhamento é a palavra chave das redes sociais. É por meio delas que artistas, famosos ou anônimos, disseminam as suas obras. Um exemplo muito comum desse fato é o uso do Facebook por alguns poetas paraenses como Antônio Juraci Siqueira, Alex Contente, Jorge Andrade e Eduardo Santos. Os quatro, assim como muitos outros poetas, usam esse site de relacionamento para expor as suas obras literárias quase todos os dias. Mas é preciso ter muito cuidado com o plágio, um tipo de crime muito comum com pena prevista em lei.

Além de poeta, Antônio Juraci Siqueira é filósofo, formado pela Universidade Federal do Pará (UFPA). O marajoara de Cajary, município de Afuá, descobriu a literatura nos folhetos de cordel quando era criança. O poeta pertence a várias entidades litero-culturais, entre as quais a União Brasileira de Trovadores, Centro Paraense de Estudos do Folclore, Malta de Poetas Folhas & Ervas e Cirandeiros da Palavra. Atualmente ele leciona aulas de Filosofia, além de desempenhar o papel de oficineiro de literatura, contador de histórias e performista. 

O poeta Antônio Juraci Siqueira já foi vítima de plágio
Juraci possui mais de 80 títulos individuais publicados entre folhetos de cordel, livros de poesias, contos, crônicas, literatura infantil, histórias humorísticas e versos picantes. Colabora com jornais, revistas e boletins culturais do município e de outras localidades, além de contar com mais de 200 premiações literárias em vários gêneros, em âmbito nacional e local.

O poeta usa o Facebook para divulgar os seus trabalhos literários desde quando se inscreveu na rede social. Ele explica o motivo de escolher a plataforma para divulgar seus poemas: “é a ferramenta dos nossos dias e tem um alcance maior e mais rápido que os outros meios de comunicação”. Juraci também destaca o retorno que recebe dos seus amigos virtuais após divulgar uma poesia na rede. “O retorno é o melhor possível. Tenho dois perfis e 5.000 amigos, além de vários seguidores. Uso meus perfis exclusivamente para divulgar literatura, a minha e de outros autores. E mesmo não marcando ninguém em minhas postagens, elas são muito comentadas, compartilhadas e curtidas, chegando facilmente às centenas”.

Mesmo com diversas vantagens, ao usar o perfil no Facebook para divulgar o seu trabalho, Juraci já foi vítima de plágio. “Não só já fui plagiado várias vezes como já se apropriaram de trabalhos meus. Isso é um risco que se corre sempre. Não tomo cuidado nenhum. No início de carreira registrei meus primeiros três livros no escritório de Direitos Autorais, na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, mas depois larguei dessa marmota. Só os bons são plagiados, então podem plagiar à vontade que não estou nem aí”, brinca.

Outro poeta que também usa o Facebook para disseminar seus trabalhos literários é o paraense Alex Contente que alega nunca ter sonhado em ser poeta, já que escrever sempre foi natural para ele. Fruto de muita leitura quando criança, onde os gibis deixavam o poeta encantado. “Adorava Mauricio de Sousa; foi natural começar a escrever e foi natural que isso evoluísse”, conta.
O poeta Alex Contente usa a Internet pra divulgar suas obras e fazer novos contatos
No final de 2011, por incentivo de uma amiga, Alex Contente começou a divulgar os seus trabalhos pela Internet. “Até então eu nem pensava nisso; o barato mesmo era escrever. Até que no final do mesmo ano, me atrevi em publicar minhas poesias no Facebook. Eis que logo depois me veio à incrível ideia: o blog. Assim nasceu o www.fala-campeao.blogspot.com. O nome é meio estranho, mas sintetiza meu lado batalhador”, afirma Contente. 

Alex Contente também acredita que há muitos internautas mal intencionados, se escondendo pelo mundo virtual, mesmo na hora de fazer críticas destrutivas na web. “Claro que a facilidade do contato da pessoa que publica tanto no Facebook quanto no blog está ao alcance de um dedinho para qualquer um opinar. Isso é fato, e na maioria das vezes, o covarde se utiliza do anonimato para dar 'tiros pelas costas'. Mas a opinião de outrem não me intimida. Criei o blog e desde então me tornei um blogueiro”, revela.

O poeta romantiza o ato de escrever poesias: “fazer poesia faz bem à alma e é um alimento sustentador para o corpo e a mente porque vivencia palavras, que ora atraem, ora repelem, os sentimentos de quem ler. O fazer poético justifica a esperança que existe dentro de mim. Vejo a poesia em tudo na vida. Sua essência vem da alma, mas a alma nunca fica saturada de poesia, pelo contrário, enche-se de graça. Contemplo-a em todos os cinco sentidos de que me foi dado. Consigo tateá-la sentado em um banco de praça, senti-la em sua mais perfeita simetria quando ouço música, assim também como consigo enxergá-la claramente em uma obra-prima como a do artista Rembrandt, sinto os cheiros impregnados nos livros quando os leio, e absorvo o gosto nas leituras ao saborear uma sopinha de letrinhas. A poesia faz parte da vida, assim como a música e a loucura. Não posso deixar de viver sem sentir isso tudo. Que o poema seja visto e sentido pelo que ele representa”.

Como poeta, Alex Contente usa as redes sociais para buscar novos caminhos e para interagir com público, além de aumentar o seu alcance de produção poética. Mas ele reconhece que precisa ter muito cuidado com as suas postagens e explica a razão: “sendo um mecanismo virtual acabo não tendo pouso em nenhum contentamento, e também como não sou um sujeito conhecido isso me faz sentir um estranho dentro de mim mesmo, mas sem querer encontrar terra prometida. Apenas divulgo minha poesia errante de cada dia. E agrado bastante as pessoas. Só não domino todos os processos antagônicos que envolvem a utilização da ferramenta”, confessa o artista.

Ele avalia o surgimento das redes sociais como um fato positivo, já que aproxima o poeta do leitor que realmente gosta de poesia e se identifica com o poema. “Eu publico maçicamente minhas poesias pelo Facebook, com quem nutro um amor e ódio. Mas amor do que ódio. Por lá posso compartilhar meus poemas com amigos poetas e leitores pelo Brasil afora; desde Marabá à Ponta de Pedras ao Rio de Janeiro a Bahia, e, quiçá, até nos Estados Unidos. Cria-se um laço espontâneo entre o público-alvo. Através deste espaço solidário já fiz várias amizades e contatos com pessoas do ramo. São novos caminhos, mas sem confessionalismo e chantagens, apenas abrindo as artérias do cotidiano. Nada mais”, ressalta.

Ao contrário de Juraci, o Alex Contente tem como se defender contra o plágio, mas não o teme. “A síndrome do copia e cola é outro sintoma alarmante, mas no meu caso, eu tenho (quase) tudo escrito à mão, e datado. Possuo um blog, que chamo carinhosamente de diário maldito, onde tudo o que quero dizer está soterrado lá, desde a minha estreia. Então, não preocupo quanto a isso. Agora, se o plágio vier acontecer vou encarar no tratamento direto com a paridade dos ombros - simplesmente aceitarei desafio que em, contrapartida, será uma arma que me salvará dos pseudopoetas ladrões de letras, àqueles que se prevalecem do 'vale-tudo' virtual. Eu não tomo muito cuidado; deixo a minha alma encarregada de atazanar a vida do impostor, que, certamente, terá um desdobramento por justa causa: apropriar-se indevidamente da produtividade dos incautos é um pecado sem originalidade. E gostar de gastar o próprio nome para se aliviar do próprio juízo”.


Alex Contente consegue não cair nas armadinhas da fama efêmera das redes sociais. “Tenho dezenas de ‘curtidas’ e compartilhamentos, mas não me empolgo com a inquietação no perfil de uma rede social. Assim como eu, tantos outros poetas se apropriam das possibilidades da internet para a leitura tão somente da poesia. Os novos tempos estão dando mais rapidez e alternativas para que tenhamos essa praticidade. A internet é um meio muito melhor e mais adaptável - digo no sentido preguiçoso do termo - pois posso ler poesias simplesmente deitado”.

O poeta acredita que a internet dá oportunidade de visibilidade para quem não possui condições financeiras de publicar os próprios livros. “As dificuldades de ter um livro publicado no mercado editorial é tão grande, e as editoras fazem tantas exigências que nem sei dizer se é viável, que dá vontade, cada vez mais, de ganhar as ruas e descobrir pari passu os caminhos para a divulgação. E sonho mais longe: precisa-se popularizar os desejos de se ter um livro registrado. Afinal, todos nós somos consumidores de arte. Embora a internet me ajude a dar visibilidade no que faço ainda sei que preciso conquistar o público para me consagrar como poeta, porque a poesia tem características muitas vezes difíceis de serem feitas até mesmo por quem estuda Letras. É uma didática difícil; contudo, não pretendo agradar um público sofisticado”, revela.

O poeta Álvaro Jorge de Sena Andrade, mais conhecido como Jorge Andrade, também usa o Facebook para divulgar as suas obras literárias. Formado em Letras pela UFPA, e com pós graduação em Ensino de Literatura pela UFPA/UEPA, ele é professor da rede pública desde 1985 e também é letrista e contista. Possui publicações em revistas, participações em antologias poéticas, já compôs com grandes nomes da música paraense e nacional. 

O poeta Jorge Andrade acredita a Internet "dispensa mediadores"

Jorge Andrade escreve poemas desde a pré-adolescente. Primeiro por brincadeira, ou namorico, depois mais sério, como jogo lúdico com a palavras e suas relações de som e significados. “Passei a utilizar a Internet, assim como deixei de usar a caneta, a máquina de escrever, e agora a internet que tem os recursos do lápis, da caneta, da máquina e outros que vieram com ela, como a veiculação, comercialização, diálogo, etc.”, conta.

Ele acredita que a Internet possui muitas utilidades. “Você quase que dispensa mediadores, diferente do livro, que é outro veículo, outra via, e de igual importância. Quero dizer que não deixei de utilizar meus poemas em livro convencional, usarei, quero, desejo editar meus livros também em versão impressa, mas enquanto não consigo, a Internet me auxilia colocá-los na rua, nas mãos das pessoas”, afirma o poeta que já possui quatro livros de poemas publicados, através de concursos e editais. O poeta também já elaborou folders poéticos artesanais, distribuídos de graça. “Fiz isso para trabalhar com meus alunos, mas pretendo lançar mais nesse formato”, revela. 

O professor poeta fala do plágio, um crime que não o mete medo. “Sempre existiu, o nada surgiu do nada é um plágio, e no caso da poesia estamos plagiando os gregos, os antigos há muito tempo, os textos de música popular, por exemplo, são as cantigas medievais. Eu realmente não tenho essa preocupação com o plágio, porque acho que há limite, a pessoa sabe o limite, a minha ideia de plágio é uma cópia, é um acinte, não uma versão, não uma ideia reutilizada”.

Há quase 28 anos o poeta Eduardo Santos escreve poesias. Ele iniciou a sua caminhada na vida poética aos 12 anos de idade. É reconhecido pela mídia e profissionais literários como o poeta das praças. Possui produção artesanal de livros e já os levou para diversos programas de rede nacional. É considerado o maior produtor de livros feitos à mão. Atualmente, ministra bate-papos e oficinas em escolas e universidades da rede pública e particular da Região Metropolitana de Belém. Com a sua livraria itinerante, adaptada, a sua bicicleta, divulga sua poesia e comercializa seus livros nas principais praças da cidade. 

O poeta Eduardo Santos resistiu para criar um perfil no Facebook
Mesmo com doze livros publicados, na maioria poemas, dois CD's de poemas narrados, um DVD de vídeo book e um filme, Eduardo Santos não dispensa a Internet para divulgar as suas obras literárias. O retorno dos internautas é muito rápido existem opiniões distintas e com diferentes repercussões sobre o trabalho do poeta.

Desde 2012 ele usa o Facebook para divulgar as suas poesias e resolveu investir no uso dessa rede virtual por causa da namorada. “Sempre procurei resistir ao máximo a ideia de criar um Facebook. Tinha os meus motivos pessoais. Sempre achei algo muito ‘invasor’, exterritorialmente perigoso, onde via dezenas de pessoas queixando-se como vítimas desse fenômeno da net. Quando resolvi criar a minha pagina, percebi então que poderia tornar à público todo aquele tempo destinado ao blog que tenho (eduardosantospoeta.blogspot.com). Dai aos pouco fui conhecendo o poder dessa ferramenta, ganhando também segurança, perceptividade, reencontrando leitores de tantas épocas importantes desse meu trajeto literário”

Eduardo Santos está precavido contra o plágio, pois todas as suas poesias, textos e artigos estão devidamente registrados. “Caso aconteça, como sei e tenho provas que muitas pessoas usam textos e imagens como de domínio particular, ainda sim, não vejo problemas para contornar esta situação. Uma vez que publicamos algo autoral, corremos riscos dessa natureza”, explica. Ele acredita ser necessário um controle mais rígido da entrada de pessoas nas redes sociais. “Há um grande número de falsos sócios. Pessoas que entram para tumultuar ou gerar problemas intelectuais”, opina Eduardo Santos.



Diego Almeida é especialista em Direito Digital
O Plágio e a lei - O advogado Diego Almeida, especialista em Direito Digital e sócio do escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, de São Paulo, explica que há punição para o plágio e que ela poderá ocorrer tanto na esfera cível como na criminal. “As obras autorais possuem ao mesmo tempo caráter moral, que diz respeito à honra e reputação do autor, e patrimonial, já que integra o patrimônio de seu autor ou de seu titular”, afirma.

Embora não exista uma definição específica na lei de direitos autorais sobre a conduta de plágio, o advogado alerta que este crime se caracteriza não só pela cópia integral ou fiel da obra originária, mas também pela utilização da essência criativa que deu origem à obra copiada.

“Pela legislação autoral brasileira, quem transmite ou retransmite uma obra protegida por direitos autorais sem a devida autorização, ou a faz sem mencionar o nome do autor responde integralmente pela conduta, podendo lhe ser imputado, na esfera civil, dever de reparação de caráter material (danos patrimoniais que o autor deixou de auferir com o uso irregular da obra) e morais (pela usurpação de sua criação sem a atribuição dos devidos créditos), cabendo ao juiz atribuir o montante a ser estabelecido como indenização, com base nos danos materiais efetivamente comprovados e levando em consideração as situações fáticas para a definição do montante a ser atribuído pelos danos morais causados”, alerta Diego Almeida.

O advogado também destaca que, caso a infração tenha sido a divulgação da obra protegida sem a devida menção de seu autor originário, o infrator terá o dever de se retratar, podendo ser compelido em apor pedido de retratação, com destaque, por três vezes consecutivas em jornal de grande circulação, dos domicílios do autor, do intérprete e do editor ou produtor, as suas próprias custas.

Diego Almeida explica que, na esfera penal, a punição pode variar de três meses a um ano de detenção em regime semiaberto, ou multa, em caso de infração sem fins comerciais, ou de dois a quatro anos de reclusão, e multa em caso de infração com intuito de lucro direto ou indireto. O advogado esclarece que além de haver uma lei que regulamenta os Direitos Autorais, a Lei 9.610/98, a proteção ao direito de autor esta prevista na Constituição Federal em seu artigo 5°, incisos XXVII e XXVIII.

A lei do Marco Civil da Internet no Brasil entrou em vigor no dia 23 de junho deste ano, mas não abordou pontos essenciais sobre os direitos autorais no ciberespaço. “O Marco Civil da Internet deixou de fora a regulamentação para este tipo de conduta, fazendo apenas menção à legislação que trate do assunto com especificidade. Como a Lei de Direitos Autorais, atualmente vigente, não traz procedimentos para compelir ou punir esse tipo de conduta de forma específica, tal matéria será tratada no projeto de lei para a Nova Lei de Direitos Autorais, ainda em trâmite e sem previsão de aprovação, devendo, neste caso, serem utilizados, por analogia, os procedimentos previstos na Lei de Direitos Autorais em vigência”.

O advogado Diego Almeida explica o que uma pessoa, em especial um artista, vítima de plágio na Internet, pode fazer para se precaver contra esse tipo de crime. “É importante que ele busque preservar as provas de que o seu direito tenha sido violado, que busque informação perante o Servidor de Aplicação que armazena a sua obra reproduzida indevidamente, no caso o próprio Facebook, e que caso assim não obtenha êxito, que busque o poder judiciário para conseguir a identificação dos autores desta conduta e que, após identificados, apresente as medidas reparatórias ou coercitivas, buscando defender os seus interesses e reputação da sua obra”.

By: Vivianny Matos (íntegra da reportagem publicada no jornal Amazônia, no dia 31 de agosto de 2014)

2 comentários:

  1. Você é a melhor editora que eu conheço. Por mais que eu esteja errado...

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    1. Ahahahha... Você está errado :P Não tenho o dom pra editar :/

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